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Ozarfaxinars
e-revista ISSN 1645-9180
Direção: Jorge Lima Edição e Coordenação: Fátima Pais
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Maio 2017
Sendas de Sucesso
com o “método de Singapura” – Parte 1/3
Dárida Fernandes
Os resultados do PISA e do TIMSS têm provocado reflexões internas que nos ajudam a pensar mais sobre a educação e no modo como se aprende e ensina Matemática em idades elementares. Decorrente da minha experiência profissional de mais de trinta anos em diversos níveis de ensino, desde o 1.º Ciclo do Ensino Básico ao Ensino Superior, as minhas primeiras palavras são de agradecimento aos obreiros do sucesso nas salas de aula, que são os professores portugueses, ao conseguirem fazer a diferença e terem contribuído para uma melhoria significativa nos resultados do PISA e do TIMSS em Portugal durante estes últimos dez anos.
Dárida Maria Fernandes é Professora e Coordenadora da Unidade Técnico-Científica de Matemática, Ciências Naturais e Tecnologias da Escola Superior de Educação do Politécnico do Porto. Doutorada em Didática pela Universidade de Aveiro, Mestre em Educação na especialidade de Tecnologias de Informação pela Universidade do Minho. Licenciada em Matemática – Ramo Educacional pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e Bacharel pela conclusão do Curso do Magistério Primário do Porto. Experiência profissional vasta no ensino da Matemática, desde o 1.º Ciclo do Ensino Básico (7 anos), no Ensino Básico e Secundário (3 anos) e no Ensino Superior (28 anos) relacionada com a formação de educadores e professores. Membro do Conselho Técnico-Científico por inerência de categoria profissional, desde 1989 e posteriormente por eleição, desde 2010, tendo assumido a responsabilidade de vários cargos de gestão intermédia na ESEPP. (Consultar nota curricular na íntegra)
Resultados obtidos no PISA e no TIMSS
O PISA (Programme for International Student Assessment), promovido pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), aplicado desde 2000 com periodicidade trianual, avalia, em alunos de 15 anos, três domínios, com enfâse de forma rotativa num domínio principal, as capacidades de mobilização de conhecimentos e competências de leitura, matemática e ciências na resolução de problemas. Na Literacia Científica avalia-se a capacidade de formular-aplicar-interpretar para o indivíduo se envolver em questões sobre ciência e compreender ideias científicas, como um cidadão reflexivo, sendo capaz de participar num discurso racional sobre ciência e tecnologia. Concretamente na Literacia Matemática avalia-se a capacidade de um indivíduo formular, aplicar e interpretar a matemática em contextos diversos e formular juízos e decisões fundamentadamente, como cidadão participativo, empenhado e reflexivo.
Em 2015, o domínio principal avaliado foi a Literacia Científica e em 2012 tinha sido a Literacia Matemática. Na Literacia Científica, num total de 72 países e economias internacionais os resultados do PISA, colocam Portugal no 17º lugar, com classificações acima da média europeia, encontrando-se no topo Singapura (SNG). Na Literacia Matemática, Singapura também está no topo e Portugal ocupa a 22.ª posição ao nível da média europeia, como mostra o gráfico 1 (Fonte: IAVE, 2015, Instituto de Avaliação Educativa).
Gráfico 1: Avaliação global na Literacia Matemática
Nos gráficos seguintes pode-se constatar a evolução global e os resultados obtidos regionalmente em Portugal, verificando-se uma maior subida entre os anos de 2006 a 2009, de 21 pontos, sendo entre 2012 e 2015 de 5 pontos.
Gráfico 2: Evolução global e regional de Portugal na Literacia Matemática
No gráfico 3 pode-se observar a evolução dos resultados obtidos nos três domínios avaliados: Ciências, Leitura e Matemática. O relatório do PISA conclui ainda que na Literacia Científica os resultados evoluíram positivamente em Portugal, desde 459, 468, 474, 493, 489 até 501, superando a média europeia, respetivamente, desde 2000, 2003, 2006, 2009, 2012 a 2015, subindo 42 pontos.
Gráfico 3: Evolução global de Portugal nas três áreas
Na Literacia Matemática os resultados também são gradualmente positivos, desde 454, 466, 466, 487, 487, 492 (ligeiramente acima da média europeia), respetivamente, desde 2000, 2003, 2006, 2009, 2012 a 2015.
No TIMSS (Trends in International Mathematics and Science Study), promovido pela IEA (International Association for the Evaluation of Educational Achievement), que avalia a Literacia Matemática e Ciências desde 1995 com periodicidade quadrianual em que Portugal participou nas edições de 1995, 2011 e 2015, conclui-se que para além de Singapura continuar no topo da lista dos países, Portugal, na Matemática, subiu desde 1995 a 2015, 99 pontos, crescendo 9 pontos de 2011 a 2015. Nas Ciências houve também um acréscimo de 56 pontos, mas de 2011 a 2015 desceu 14 pontos, como revelam os três gráficos seguintes.
Gráfico 4 e 5 : Evolução dos resultados de Portugal na Matemática e resultados internacionais TIMSS
Gráfico 6: Evolução dos resultados em Portugal no TIMSS
Para quem, no início do século XXI, assinalou o quarto lugar de Portugal a contar do último classificado da lista do PISA ou do TIMSS, fica-se orgulhoso por tamanho engenho ao assinalarmos com confiança a nossa classificação ao nível da média europeia. É por isso que fazem sentido as minhas primeiras palavras de agradecimento, pois a aposta na educação e na formação de professores mobilizou vontades e provocou resultados mais positivos nas aprendizagens matemáticas das crianças, como aconteceu, de forma bem visível, no período 2005_2006 até 2010_2011, associado ao desenvolvimento do Programa de Formação Contínua em Matemática para Professores do 1.º e 2.º Ciclos do Ensino Básico.
Mas a determinação de prosseguir na senda dos bons resultados continua e, neste contexto, as minhas palavras de agradecimento vão agora para todos aqueles que desenham com engenho, arte e arrojo uma estratégia de evolução tendo como Singapura um país inspirador para alavancarem esta missão de provocar aprendizagens matemáticas mais duradoiras e consistentes nas crianças. Felicitações por isso: pela vontade, estratégia e visão a longo prazo, pois as crianças são a geração futura desta sociedade.
Acredito que este “overview” orienta-nos para uma rota de sucesso e alicerça a nossa ação futura, pois este avivar da memória estimula-nos e dá-nos força para continuar nesta senda de sucesso!
Em Londres, de 10 a 12 março de 2017, numa formação em que participei sob a égide do “Mundos de Vida” com o especialista em educação matemática Yean Ban Har de Singapura aprendi que “não existe o método de Singapura, mas Matemática em Singapura!” (sic). De facto, em 1980, um governante com visão estratégia, apostou na educação e quis criar um projeto mental para o país entrado na aprendizagem sólida da ciência Matemática. Nessa sequência dinamizou a sociedade em torno deste objetivo, reuniu consultores desta área e de forma convergente fez erguer um projeto em educação centrado na pessoa, no desenvolvimento do raciocínio das crianças e na capacidade de resolver problemas. Por outro lado, elegeu a qualidade da formação de professores e dos diretores das escolas como âncoras da mudança. Esta crença enraizada na comunidade sobre a forma de aprender e ensinar Matemática e que está alicerçada na qualidade da formação dos professores e na visão estratégica sobre a educação do timoneiro que dirige a Escola tem dado resultados positivos em Singapura, em diferentes áreas do crescimento intelectual, económico, cultural e social do país.
Caraterização Geral do “Método de Singapura”
Em Singapura o processo de aprendizagem e ensino da Matemática fundamenta-se no conhecimento profundo da ciência Matemática. Deste modo, os futuros professores do Ensino Primário adquirem um conhecimento concetual sólido sobre as matérias que vão lecionar, porque “só se pode ensinar aquilo que se sabe” (Ban Har, 2017). Neste contexto, na formação inicial aprendem-se as matérias e as didáticas específicas da disciplina. Para isso são estimulados os melhores alunos a seguirem a carreira de professor pelo prestígio social que tem no país e por serem os promotores da produção de conhecimento junto das crianças e dos jovens, contribuindo de forma decisiva para a melhoria da qualidade da formação das gerações futuras da sociedade.
Por outro lado, as didáticas específicas fundamentam-se numa matriz teórica consistente e com provas dadas, concretamente, nos estudos de Jean Piaget, Jerome Bruner, Lev Vygotsky, Zoltan Dienes, George Polya e Richard Skemp. Segundo Bruner, Piaget e Vygotsky é impossível aprender matemática sem manipular materiais e discutir socialmente as nossas ideias. Por outro lado, Zoltan Dienes defende que é necessário selecionar o conteúdo a lecionar, ter intencionalidade pedagógica na escolha criteriosa das tarefas e dar enfoque a uma prática que faça sentido para a criança. Nestas circunstâncias, para Ban Har (2017) é absolutamente crucial que o professor saiba selecionar o assunto e não ensinar apenas o que as crianças querem saber.
Também para Skemp, no processo de aprendizagem e ensino da Matemática é preciso incluir três fatores, a convenção simbólica, os aspetos concetuais e outros de natureza procedimental. Sobre os resultados positivos produzidos por estas metodologias pró-ativas não há dúvidas que em Singapura a exploração do conhecimento matemático se deve alavancar nas didáticas específicas da disciplina. Acredita-se que a criança é o arquiteto ativo da sua própria aprendizagem e, nesta perspetiva, aprende pela ação sobre os objetos, em processos internos de assimilação e de acomodação, como defende Piaget. Esta ideia fundamenta-se no facto da criança ao aprender integra o conhecimento no anterior, servindo este de suporte para sustentar o novo conhecimento. Daqui decorre a importância do conhecimento prévio que o professor deve identificar para explorar/ensinar um novo conceito que se aprende “step by step” (passo a passo), em “scaffold” (por andaimes, por degraus) e de forma progressiva (Ban Har, 2017).
Assim, na planificação para a exploração do novo conceito o professor deve selecionar os materiais mais adequados, traçar, com critério, as questões orientadoras da aprendizagem para estimular e provocar a criança, ouvindo-a em processos amplos de metacognição (pensar sobre o seu próprio pensamento) e de auto-avaliação. No essencial, o princípio metodológico foca-se no saber ouvir(escutar) a criança, escutando-a com atenção, percebendo como interpreta a informação lida, como relaciona os dados do problema, como se expressa com o outro, qual o vocabulário matemático que usa nessa partilha de ideias, quais as dificuldades que regista e para as quais deve revelar consciência e uma auto-avaliação contínua.
Nesta interação verbal é fundamental (re)colocar questões para que a criança aprofunde a compreensão, relacione melhor os assuntos e desenvolva processos de metacognição. Para Ban Har (2017) é desta forma de comunicar com o estudante que resulta a aprendizagem, alicerçada num acompanhamento contínuo e individualizado, de prática guiada, mas sempre com o horizonte numa prática autónoma. Nesta interação verbal para além de se valorizar processo (“how?”), deve-se sobretudo dar mais importância ao “porquê?” (“why?”).
Neste diálogo existente na classe usa-se a linguagem matemática e apreende-se o vocabulário universal da disciplina de forma progressiva e consistente. Por isso, a comunicação matemática tem de ser trabalhada de forma conveniente, do oral para o escrito, respeitando as diferentes etapas da apropriação do conhecimento. Neste processo gradual só depois de um conceito estar bem adquirido e mobilizado na resolução de problemas é que se deve passar para a pesquisa de um novo conceito. Nesta abordagem prevê-se a manipulação de materiais, a representação pictórica, iconográfica ou esquemática e, por fim, a representação simbólica matemática (a construção de proposições matemáticas) como defendiam Bruner e Piaget, nas fases do conhecimento matemático.
Assim, em Singapura estas fases são aplicadas e é implementada a abordagem didática apelidada de “CPA” (Concret - Pictorial - Abstract), sendo a comunicação matemática transversal às três fases, como mostra a figura 1. Os especialistas da educação referem ainda que não vale a pena entupir as crianças com matérias e mais matérias… tem de se ser eficaz e dar enfoque ao essencial, com intencionalidade concetual e pedagógica, valorizando as estratégias individuais de cálculo mental, a metacognição, a flexibilidade mental e a capacidade de visualização.
Figura 1: Metodologia CPA
Para Ban Har (2017) através destas práticas pedagógicas procura-se desenvolver o raciocínio e as potencialidades do cérebro da criança, de forma equilibrada, global e particular, pensando em todos os lóbulos que o constituem, tal como o lóbulo frontal, desenvolvendo a flexibilidade mental, a formação concetual, a capacidade de resolver problemas, o raciocínio abstrato e a metacognição. Por outro lado, ao desenvolver destrezas de cálculo pensa-se no lóbulo parietal (médio) e a memória pelo lóbulo temporal (médio) e da parte de trás do cérebro, o lóbulo occipital, é desenvolvido quando se estimula a visualização.
A resolução de problemas no cerne da aprendizagem matemática
Nos anos oitenta ao ser criado o projeto mental para o país, alicerçou-se o currículo e o Programa de Matemática de Singapura na resolução de problemas. Sendo o “coração” da aprendizagem matemática este processo inclui cinco componentes bem especificadas, como mostra a figura 2.
Figura 2: A resolução de problemas no centro da aprendizagem matemática em Singapura
A escolha do problema para motivar e problematizar o conhecimento tem de fazer sentido para a criança. Para isso “é necessário escolher um bom problema e não uma história absurda” (Ban Har, 2017). Por exemplo, quando se coloca o seguinte problema: “A Maria tem 12 anos e a mãe tem o dobro da idade da filha. Quantos anos tem a mãe da Maria?” é natural que uma criança se aproxime da professora (como aconteceu numa Escola) e dirigindo-se à professora refira: “Não percebo, professora!” A professora surpreendida pergunta: “Mas não entendes o quê? Não percebes o que significa o dobro?”. A criança responde: “Não é isso, professora! Sei muito bem o que é… e a resposta é 24! Mas não pode ser, pois a mãe ainda não era adulta para ter a filha, pois teve de ficar grávida aos 12 anos e isso não pode ser!”.
A professora refletiu sobre o que tinha acontecido e percebeu que este era um problema sem história e que segundo Ban Har (2017) não deveria ser proposto à turma! De facto, para os especialistas de Singapura este é um exemplo de um problema absurdo, um problema que não faz sentido, pois a criança na resolução do mesmo não se foca no essencial das aprendizagens matemáticas, mas “perde-se” em observações secundárias.
No exemplo seguinte, na resolução do problema, segundo o “método de Singapura” devem-se valorizar as diferentes estratégias usadas pelas crianças ou sugeridas pelo professor após a discussão aberta sobre o assunto, pois não existe um único caminho para ensinar Matemática.
Problema
(exemplo da formação desenvolvida em Londres, maio de 2017
e existente no projeto “maths no problem”, do Texbook 2):
Dados os vasos e a flores seguintes, quantas flores há no total?
Numa primeira fase deve-se realizar a exploração oral do problema, tendo por base a imagem da situação ou a existência de materiais concretos relacionados com a natureza do problema.
E nessa discussão concluir que é preciso completar a proposição matemática: 7+3+2=
Após esta exploração oral a criança sozinha, em par ou em grupo, conforme a indicação do professor, deve propor uma solução, podendo munir-se de diferentes estratégias, como as que, por exemplo, são indicadas no livro e sítio do projeto (mathsnoproblem.com)
1.
Estratégia 1: Fazer 10 ou identificar os “amigos do 10”,
como se mostra na figura anterior: 7+3+2=10+2=12
Para além de usar esta estratégia podem ser sugeridas outras, relacionadas com outros conceitos, como os expostos de seguida.
2.
Estratégia 2: Descobrir os iguais e adicionar 6 com 6.
Nesta estratégia recorre-se à decomposição de quantidades que em Singapura
é chamada de “number bond”, onde o todo se decompõe o número em partes (whole-parts).
3.
Estratégia 3:
descobrindo o “number bond” de 7: 2 e 5 7+3+2=2+5+5= 2+10=12
4.
Outras estratégias podem estar
relacionadas com o rearranjar os vasos com 4 flores cada um,
se fosse de 2 em 2 teria de
arranjar mais vasos, assim como de 3 em 3.
Nestas experiências
exploratórias a criança pode manipular flores ou outros materiais, porque depois
de perceber o problema e relacionar a informação deve resolvê-lo em linguagem
matemática e desenvolver, deste modo, o raciocínio abstrato.
Todavia, o problema pode ser apenas uma asserção
matemática, por exemplo:
Como calcular: 300-125=?
Uma criança sugeriu:
300-125 = 299-125+1=174+1=175
Claro que é uma opção
prática e eficaz, porque deste modo a subtração não acarreta reagrupamento (ou
seja a subtração “com transporte”). Todavia, neste caso, para Ban Har (2017) o
professor deve dar ênfase ao valor posicional do algarismo no número. Para isso
deve usar o conceito de “number bond” (decomposição do número em partes da forma
mais conveniente) mas realizando a leitura do número por ordens, como mostra a
figura 3.
Figura 3: Decomposição do
número 300 em centenas, dezenas e unidades
Para realizar este tipo
de trabalho o professor explora o MAB, como mostra a figura seguinte (figura 4),
em que as centenas são identificadas pelas placas, as dezenas pelas barras e as
unidades pelos cubinhos.
Figura 4: MAB ou
Material de peças Multibásicas de base 10
Este material deve ser
manipulado pelas crianças para estas aprofundarem o sentido do número (“number
sense”), designadamente, o valor posicional dos algarismos que constituem o
número, como se pode observar na figura 5, em que a criança explora as dezenas e
as unidades para realizar adições.
Figura 5: Exploração do
MAB, com dezenas e unidades para realizar adições
Retomando o cálculo
proposto anteriormente: 300-125= ao decompor-se o 300=2C 9D 10U, ao subtrair 5 a
10 dá 5 unidades, 2 dezenas a 9 dá 7 dezenas e 2 centenas a subtrair 1 centena
dá 1 centena, resulta a diferença em 1 centena, 7 dezenas e 5 unidades, isto é,
300-125=175. Neste tipo de aprendizagem a criança deve manipular o material para
tirar conclusões e desenvolver o raciocínio dedutivo e indutivo.
Por exemplo, quando se
relaciona o 100 com 9D 10U; ou 500 com 4C 9D 10U, então pode-se descobrir a
regularidade existente na sequência seguinte e este tipo de trabalho facilita o
uso posterior do algoritmo.
Para além de se pedir à criança para completar a sequência,
pode-se solicitar ainda a análise da relação existente entre a representação do
número da primeira linha e da segunda linha e entre as colunas. Como se referiu
é absolutamente necessário, neste método, ouvir as crianças sobre o que
observam, discutir sobre essas produções mentais para neste processo desenvolver
processos de metacognição, insistindo e indagando-a: “porquê?” e/ou “tens a
certeza?” (Why? Are you sure?). Por exemplo perguntar: “por que razão o número
das centenas cresce uma unidade, coluna a coluna e de linha para linha decresce
em relação ao número dado?” ou “Por que razão o número das dezenas é sempre o
mesmo? E o que acontece ao algarismo das unidades? Porquê?...” As crianças devem
exprimir oralmente esses raciocínios e depois divulgá-los, escrevendo-os no
jornal diário onde regista todos as matérias abordadas na aula e as
justificações dadas.
Estrutura da aula de matemática
Em Singapura a aula de Matemática tem uma estrutura própria, a qual deve ser iniciada pela resolução de um problema concreto, seguindo uma sequencialidade que tenha significância didática e faça sentido para a criança. A estrutura da aula comporta basicamente seis momentos:
Exploração do problema
(10 minutos)
É colocado um problema pelo professor
que deve ser explorado em grupo, prevendo o uso de materiais
Discussão em grande grupo
(10 minutos)
Neste momento deve ser realizada a apresentação das diferentes estratégias
concretizadas pelos vários pares ou grupos formados
Construção do jornal, com escrita do que foi realizado
(10 minutos)
Nesta fase provoca-se a discussão em grupo e individual
para que cada criança reflita sobre o que fez e sistematize o conhecimento adquirido.
A reflexão é o processo vital da aprendizagem,
pois “não se aprende quando se faz,
mas somente quando se reflete sobre o que se fez” (Ban Har, 2017).
Nesta abordagem é necessário ainda atribuir um título à aula, no início, durante a aula ou no fim,
para dar um significado temático à sessão.
Revisão do que foi escrito no jornal
(10 minutos)
P
ara uma melhor sistematização do conceito,provocando mais reflexão para compreender e relacionar o que se fez.
Escrita de ideias e prática guiada
(10 minutos)
O professor deve realizar a seleção criteriosa de tarefas para as crianças as realizarem.
Prática autónoma
(10 minutos)
com a realização de problemas e de exercícios adequados.
A criança deve realizar individualmente as tarefas propostas
sem intervenção dos colegas ou do professor.
Para Ban Har (2017) pode haver alguma flexibilidade por parte da escrita do jornal, havendo professores que o realizam ao longo da aula e outros só no final, mas tem de haver sempre intencionalidade concetual da aula e, nesta sequência, tem de ser escrito o tema da lição, definido desde o início ou discutido com a classe no final para que as crianças possam dar sugestões sobre a temática tratada.
Um outro aspeto relevante tem a ver com a necessidade da criança relacionar e compreender melhor os temas lecionados. Deve-se evitar a memorização sem sentido, os procedimentos rotineiros e áridos, bem como o tédio nos cálculos.
Aprendizes aborrecidos não podem existir na sala de aula! A motivação, o gosto, a vontade e a alegria de aprender tem de fazer parte do dia-a-dia da aprendizagem matemática na classe.
Este é um exemplo de um cálculo que provoca tédio nas crianças: 47325 x 315 = ? Segundo Ban Har (2017) “podem ser feitos, mas para quê quando existem as máquinas para os realizarem e com tanta rapidez!?”. Não podemos olvidar que o sistema de educação tem de preparar os estudantes para um mundo incrivelmente tecnológico!
Por outro lado, evitar ainda realizar o procedimento seguinte ou outros idênticos sem explicação: 1/2: 1/6 = 1/2x6/1=… Temos de concretizar primeiro com as crianças, mostrando como se relacionam estas expressões, usando materiais adequados para o efeito (num próximo artigo abordar-se-á a aprendizagem dos números racionais de representação fracionária, numa perspetiva compreendida, como é lecionado nas Escolas de Singapura).
Por outro lado, para Ban Har (2017) as rotinas na classe são fundamentais, sugerindo que a constituição dos grupos deveria ser entre 4 a 6 elementos, existindo ainda o tempo do “carpet time”, momento em que as crianças estão sentadas à frente, bem perto do professor e do quadro principal. Propõe ainda algumas diretrizes concretas para se fazer matemática na classe, designadamente:
- Contar uma história com sentido, não uma história absurda…
apresentar um problema com história.
- Desenhar uma imagem / desenho / diagrama / esquema.
- Explicar oralmente aos seus colegas para acreditarem na sua ideia,
isto é argumentar o seu raciocínio.
- Explicar por escrito a sua ideia e escrever essa ideia
como uma notícia no jornal ou no seu caderno ou diário de bordo.
- Encontrar desafios para cada criança ou o grupo propor aos outros.
No respeito pela diferença e para aquelas que terminam uma atividade mais cedo do que o previsto, Ban Har (2017) sugere três ideias para essa(s) criança(s):
- Construir uma história
que tenha sentido sob o ponto de vista matemático;
- Escrever uma nota para um amigo ou colega
sobre qualquer assunto ou para escrever no jornal;
- Entregar um novo desafio e se for numa classe do 3.º ano
pode ser: “de quantas maneiras se pode dividir um quadrado em quatro partes geometricamente iguais?”
Neste caso concreto é preciso que pensem e analisem as diferentes soluções.
Neste tipo de tarefa é necessário distinguir
o conceito de geometricamente iguais de superfícies equivalentes.
Apesar das salas de aula do 1.º e 2.º anos de escolaridade terem em média 30 alunos e as do 3.º e 4.º anos de escolaridade 40 alunos, a diferenciação pedagógica também acontece para crianças com dificuldades existindo um reforço delineado por um assistente, devidamente ancorado numa estratégia global de sucesso, de cada criança, do grupo e da turma. Na Escola Primária existe todos os dias, pelo menos, 1h de Matemática num total de aproximadamente 200h por ano. No final dos seis anos de escolaridade existe um exame nacional.
Na senda do “método de Singapura”, nas próximas publicações será focado o cálculo mental, a resolução de problemas como gerador da aprendizagem da adição e da subtração, bem como a importância dos algoritmos e de pormenores cruciais na aprendizagem da Matemática relacionados com este método, tais como o conceito de “number bond”, “model bar”, entre outros. Numa outra produção serão explicitadas a multiplicação, a importância das tabuadas e da sua ou não memorização, a calculadora como instrumento de desenvolvimento do raciocínio, a divisão e as propriedades associadas que permitem a exploração de algoritmos que promovam a compreensão, bem como os números racionais de representação fracionária. Estejam atentos, pois é mais uma oportunidade para aprender e sermos melhores profissionais!
Algumas Referências
Duque, A., Fernandes, D. & Mariz, B. (2010). Guia do professor da Nova Matemática. Porto: Porto Editora.
Fernandes, D. (1994). Educação Matemática no 1º ciclo do ensino básico. Porto: Porto Editora
Fernandes, D. (2006). “Aprendizagens algébricas em contexto interdisciplinar no ensino básico”. Tese de Doutoramento não publicada, Universidade de Aveiro, Aveiro, Portugal.
Har, Bean YY. (2017). Apontamentos de formação sobre o projeto “mathsnoproblem” – Singapoure maths. Londres.
NCTM (2007). Princípios e normas para a Matemática escolar. Lisboa: APM.
Piaget, J. (1975). A formação do símbolo na Criança. (2ª edição). Rio de Janeiro: Zahar Editores/MEC.
PISA (2012). Results in Focus What 15-year-olds know and what they can do with what they know. In Gurría, A. (Ed.). Report OECD 2014.
Ramakrishman, C. e Wah, B. (2015). INSPIRE MATHS. ASSESSMENT BOOK 1. Kheong, F. (Consultant and Author of Singapore Maths). Skinner, C. ; D´Angelo, S. e Gibbs, E. (UK consultants). Oxford: OXFORD University Press.
Ramakrishman, C. e Wah, B. (2015). INSPIRE MATHS. PRACTICE BOOK 1A. Kheong, F. (Consultant and Author). Skinner, C. ; D´Angelo, S. e Gibbs, E. (UK consultants). Oxford: OXFORD University Press.
Ramakrishman, C. e Wah, B. (2015). INSPIRE MATHS. PRACTICE BOOK 1B. Kheong, F. (Consultant and Author). Skinner, C. ; D´Angelo, S. e Gibbs, E. (UK consultants). Oxford: OXFORD University Press.
Ramakrishman, C. e Wah, B. (2015). INSPIRE MATHS. PUPIL TEXTBOOK 1A. Kheong, F. (Consultant and Author). Skinner, C. ; D´Angelo, S. e Gibbs, E. (UK consultants). Oxford: OXFORD University Press.
Ramakrishman, C. e Wah, B. (2015). INSPIRE MATHS. TEACHER´S GUIDE 1A. Kheong, F. (Consultant and Author). Skinner, C. ; D´Angelo, S. e Gibbs, E. (UK consultants). Oxford: OXFORD University Press.
Site: http://pt.wikihow.com/Ensinar-a-Matem%C3%A1tica-de-Cingapura
Nota curricular da autora
Dárida Maria Fernandes é Professora é Coordenadora da Unidade Técnico-Científica de Matemática, Ciências Naturais e Tecnologias da Escola Superior de Educação do Politécnico do Porto. Doutorada em Didática pela Universidade de Aveiro, Mestre em Educação na especialidade de Tecnologias de Informação pela Universidade do Minho. Licenciada em Matemática – Ramo Educacional pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e Bacharel pela conclusão do Curso do Magistério Primário do Porto. Experiência profissional vasta no ensino da Matemática, desde o 1.º Ciclo do Ensino Básico (7 anos), no Ensino Básico e Secundário (3 anos) e no Ensino Superior (28 anos) relacionada com a formação de educadores e professores. Membro do Conselho Técnico-Científico por inerência de categoria profissional, desde 1989 e posteriormente por eleição, desde 2010, tendo assumido a responsabilidade de vários cargos de gestão intermédia na ESEPP. É responsável por Unidades Curriculares de Matemática e Ensino da Matemática relacionadas com a formação de Educadores de Infância e de Professores do 1.º e 2.º Ciclo do Ensino Básico (CEB) e pela Supervisão na Prática de Ensino Supervisionada de professores do 1.º e 2.º CEB. Participação em júris de seleção e seriação de candidatos para os mestrados profissionalizantes, participação em júris de mestrado e de doutoramento em outras instituições. Participação ativa em congressos nacionais e internacionais, com apresentação de comunicações individuais ou em grupo, resultantes de trabalhos de investigação realizados sobre várias temáticas, designadamente sobre o ensino da Álgebra em contexto interdisciplinar em aprendizagens formais e não formais, formação inicial e contínua de professores. Coordenadora do mestrado em ensino do 1.º e 2.º CEB e do atual mestrado em ensino do 1.º CEB e em Matemática e Ciências Naturais do 2.º CEB. Coordenadora de diversos projetos relacionados com o ensino da Matemática: “Baú de Matemática” (9 anos); “Envolvências Geométricas I e II – A Geometria na Cidade” (4 anos), patrocinados pelo programa Ciência Viva, bem como do “Divertir com o saber”, uma parceria com a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia (11 anos). Coordenadora de várias formações no âmbito da Matemática e do Ensino da Matemática, designadamente, do Programa de Formação Contínua de Professores do 1.º e 2.º CEB, de iniciativa Ministerial, durante 6 anos de vigência do mesmo. Professora e colaboradora na área de Matemática em várias universidades europeias, designadamente, em França, Inglaterra, Estónia, Espanha, Eslovénia, Holanda, Hungria, entre outras, resultante de parcerias institucionais e de um projeto de formação de professores do “Ensino Primário”, a nível europeu, designado por EPTE (European Primary Teachers Education). Leader na ESEPP, de 2012 a 2015, do programa PAEDEIA onde estiveram envolvidos cinco países: Dinamarca, Finlândia, Suécia, Turquia e Portugal, relacionado com o programa de indução. Conferencista em vários congressos nacionais e internacionais por proposta ou convite como Keynote Speaker na área de Matemática e Ensino desta disciplina. Autora de manuais para o 1.º CEB e de roteiros para inovar práticas nesta disciplina, bem como de livros para professores e artigos publicados em revistas ou livros de referência. Formadora responsável de diversas ações de formação, de sua iniciativa ou em colaboração com outros formadores para centros de formação, instituições de solidariedade social ou outras. Consultora de Matemática em várias instituições, desenvolvendo projetos inovadores, sendo um deles relacionado com a implementação do “método de Singapura” e do “math daily 3” em desenvolvimento no 1.º Ciclo do Ensino Básico.
No ano letivo, 2017-18, exercerá funções de formadora no CFAE_Matosinhos, no âmbito do PNPSE - Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar, enquadrado em protocolo estabelecido entre a ESEP - Escola Superior de Educação do Porto e o CFAE_Matosinhos.
Agradecemos, desde já, a sua opinião sobre este número - ozarfaxinars@gmail.com
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